sábado, 18 de dezembro de 2010

NATAL MUSICAL


NATAL MUSICAL
                                          Por Zé Alípio Martins

É bom que toque... O sino pequenino...
Mas, não só os... Sinos de Belém...
Também que os de “Nossa capelinha”
Possam ser ouvidos também

Pois, por aqui... Já nasceu... Um... Deus menino...
O foguetório nos convida pra festa
Quem sabe vai ter um... “Rala-bucho”?
Um forrózinho... Mela cueca”?

Regado de “meladinha” preparada
Com arruda, cebola branca e mel do mato
Uma cachaça “Lava a jega”
E um churrasquinho de gato

Seresta pros mais adultos
Que passam da “Terceira idade”
Batuque, um sambinha gostoso
Pode ficar na vontade!

-Cê que sabe meu fio!
Mas se é...  Para o nosso bem...
- “To de mala e cuia” nem que eu acorde...
Ouvindo os... Sinos de Belém...

Se... Cá na terra pede o sino...
Alegre a cantar...
Deixe a tristeza de lado
E vamos confraternizar

Pegue na mão alheia... Dê um beijo
Ou um abraço apertado!
Diga Feliz Natal
Faça um gesto inusitado!

Peça ao Deus que sempre nasce
Dentro de cada um que o procura
Que os anjos nos acompanhem
Com harpa, violão e zabumba

Fazendo o que faz Dona Loura
De festa em festa a andar
Em Quermesse é “cantadora de reza”
Em serenatas... Faz cantiga ao luar

Nos Pastoris é Pastora
Rainha em Maracatu
Dança “samba de crioula”
Jongo e também Lundu

Samba desde menina
Nas rodas pelos cantos afora
No carnaval é Colombina
Faz repente e “moda de viola”

Mas... É Natal todos sabem!
E como é de costume
Vestiu seu vestido vermelho
Encheu a cara de pó e perfume

E também foi comemorar
O nascimento de mais... “Um Jesus”
Filho do Compadre José
Que comadre Maria... Acabou de “dar a Luz”

Que ilumine os seus dias futuros
De alegria, saúde e riqueza
De muita sabedoria
Simplicidade e sutileza

Que encontre um mundo igualitário
De casa farta e enfeitada
Folias de Reis cantando
Anunciando a sua chegada

Entonce! Faça do seu jeito
Da sua maneira e como pode
Se não gostar disso tudo
Pode cair no Pagode

Mas, não deixe de convidar
De estar na roda de amigos
Ou nas resenhas familiares
Opa! Sem ressentimentos antigos!

Fazendo com que o... Som dos sinos
Vindos de longe... Do além
Possam, enfim, em consonância
Com os... Sinos de Belém

Trazer-nos inspiração
Acordes em harmonia
Para compor uma canção
De Paz, amor, saúde e alegria

Bom Natal!

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

CARTA AO MEU, PAPAI NOEL




                                                                                       Por Zé Alípio Martins  
Querido Papai Noel.
Quanto tempo que o Senhor não aparece!
Quanto tempo que não ouço aquela sua risada incomum!
Brincando... Lá se vão 20 anos!
Sei que também deve sentir, como eu, uma saudade de apertar o peito e fazer o lagrimar ensopar os óculos.
Lembro-me, que nessa época de Natal, costumava se virar de todo jeito e encontrar uma maneira de nos presentear.
Não devia ser fácil. Éramos sete. Meninas e meninos...
“Uma roupinha diferente pras meninas que estavam ficando mocinhas”!
“Um sapato novo pro mais velho, pois seu pé cresceu bastante”!
“Um boneco chamado Paulinho pra mais nova”!
Um fusca verde pra mim!
E uma bola pro João...
Era uma luta!
Mainha corria pra máquina de costura e delegava a casa às meninas.
Era “um tal”de mudar as coisas de lugar...E logo o chão estava vermelhinho e deslizando de “Cera Parquetina”!
Dessa vez... Ninguém reclamava dos afazeres.
Era Natal e seu espírito já prenunciava tais atitudes.
“Na “Radiola Stéreo Philips”, era tempo de ouvir o velho compacto duplo “A Harpa Celestial”, as mesmas quatro canções do ano passado.
No lado “A”... Só Natalinas: Jingle - Bells e Natal das crianças.
No lado “B”... Boas Festas e Feliz Ano Novo.
Aquelas canções nos deixavam solícitos e em harmonia.
Meu querido Papai Noel!
Lembro-me demais da sua luta e do seu jeito peculiar em nos atender.
Como assistindo ao filme “ O Nascimento de Jesus”, acompanhei a sua mudança física. A velhice ia trazendo-lhe marcas no rosto, nas mãos e cabelos.
Ao perceber que tantos fios brancos “Surgiam de repente”! Quis disfarçá-los pintando-os...Lembro bem!
-Ficou esquisito. Disse minha mãe.
Fique tranqüilo! Pois, todo Papai Noel tem cabelo e barba brancos.
Logo você soube entender.
Por sua pouca vaidade... Por sua maneira simples de viver.
Sempre quis demonstrar que era forte e saudável. Corado e disposto.
Ninguém imaginava que alguma doença estivesse te acompanhando!
Calada e silenciosa!
Até deixá-lo fraco, triste e enfermo.
Poucos dias pro Natal e você partiu...
Era 14 de dezembro.
Casas e ruas enfeitadas se mostravam alheias às nossas tristezas.
Passamos o “Primeiro Natal”, sem o “Nosso Papai Noel”.
Não houve cartas, árvores, presentes e risadas.
A nossa casa ficou vazia e opaca sem a vermelhidão da Parquetina.
Viajamos todos... Pra qualquer canto... Sofremos muito.
Naquele ano ao tentar armar o presépio, coisa que nós dois fazíamos todos os anos juntos, não consegui.
Não consegui nem desenrolar os figurantes daquele papel de jornal que cuidadosamente os enrolou.
Naquele ano não nos alegramos em iluminar a goiabeira do sítio com a gambiarra de lâmpadas coloridas que o senhor confeccionou.
Aquele ano Pai, não teve Noel e nem Natal!
Sua calça e sua camisa, de ir à “Missa do Galo”, ficaram por vários anos guardadas.
Queríamos o nosso Natal e já não o podíamos ter.
Queríamos aquele “simples Natal”, onde o Senhor puxava a oração pra ceia.
E ante a pressa de dormir, na certeza dos presentes... Gostava de ouvi as velhas histórias do menino criado no Irará por sua avó Ana, montado num cavalo de pau “Com crina e tudo”, feito por seu tio João da Rosonha.
Do “Papai Noel de chocolate”, único presente que seu pai lhe deu.
Da sua bicicleta decorada com uma cara de gato do mato...
Da “ Touca de Crochê e sua fama de comelão!
   Do seu baralho guardado na caixinha de perfume... Tá comigo até hoje!
   Depois Íamos dormir pra cedo acordar e abrir os presentes.
Um fusca de plástico verde...  Uma bola “Dente de leite”... Um peão de madeira bem torneado...  Carretel de linha para “Arraia” de marca “Três corações”... Um boneco chamado Paulinho... Um calção com bolso, feito por minha mãe, pra botar as bolas de gudes... Um vestido “diferente” pras meninas...

   E era assim meu “Bom Velhinho”!
   Na certeza de um novo encontro.

    FELIZ NATAL!
    
    Que estejas com Deus e com todos os anjos.

sábado, 13 de novembro de 2010

É COISA DE NEGO!

Por Zé Alípio Martins

“Deseja tudo é normal
Morrer de amor natural
Coisa de nego afinal
Viva a Bahia”
“Batuques e atabaques
A pele da mesma cor
Todos à linha de ataque
De Angola São Salvador"
Coisa de Nego- Raimundo Sodré

Rum, pi e lé , atabaques ecoou
Alabê, divindades chamou
Babalorixá, Ialorixá e filhos de terreiro
É coisa de Nego

Candomblés, Xangô e Orixá
Ogã, Iaô, Nanã e Iemanjá
Catimbó e caruru de preceito
É coisa de Nego

Acarajé com pimenta e Abará
Moqueca, Dendê e Vatapá
Maniçoba e leite de coco seco
É coisa de Nego

Chula, Jongo e Lundus
Batuques, Bantos e Maracatus
Folia, Roda, Chegança e Guerreiro
É coisa de Nego

Pixinguinha, Choro, Xote e Baião
Marinês, Sivuca, Gonzaguinha e Gonzagão
Nelson, Rabeca, Salustiano e Hermeto
É coisa de Nego

Samba, Futebol, Capoeira e Afoxé
Mestre Bimba, Garrincha, Cartola e Pelé
Bob, Rasta, Reggae, Carnaval e Frevo
É coisa de Nego

Lutas, Consciência, Resistência e Atitude
Trabalho, Lazer, Educação e Saúde
Identidade, Etnia e Movimento Negro
É coisa de Nego

Beleza, amizade, entidade e axé
Homem, menino, menina e mulher
Alegria, Vaidade e trança no cabelo

Isso! É coisa de Nego.

BERIMBAU - O som que imita o nome

A onomatopéia escreve: BE – RIM – BAU
Seu som diz: BERIMBAU

“Capoeira me mandou / Dizer que já chegou / Chegou para lutar
Berimbau me confirmou / Vai ter briga de amor/ Tristeza camará”...
Baden Powell e Vinicius de Moraes

O que melhor traduz o toque do berimbau é a escrita do seu próprio nome: BE-RIM-BAU
Para os aprendizes da arte de tocar o Berimbau vai ser o seu primeiro exercício:
Instrumento apoiado na barriga, dois toques da vareta na corda e mais um toque afastando o instrumento do corpo. E então se ouve:
BE- RIM-BAU
“No início o instrumento tende a ir pra esquerda... Pra direita... Mais algumas tentativas... Logo vem o equilíbrio e você já ouve o instrumento dizer : Berimbau” Mestre Venceslau-Ba
Não conheço outro instrumento que o seu som seja tão bem representado pelo seu nome.

“Até quem sabe a voz do dono. Gostava do dono da voz”
Chico Buarque

Berimbau é uma palavra brasileira. Porém, também pode ser associado ao nome mbirimbau, vindo do termo Balimbano.
Instrumento que, em sua origem africana, era utilizado com funções pastoris. Somente incorporado a capoeira aqui no Brasil.
Também conhecido por .: berimbau-de-barriga, bucumbumba, gobo, macungo, marimba, marimbau, matungo, mutungo, uricungo, urucungo e mbirimbau que é o berimbau de boca.
O instrumento musical Berimbau é classificado na família dos cordofones, assim como o violino a guitarra...
Apesar de sua aparência simples é possível obter timbres diversos e riquíssimos padrões rítmicos.
Sua cabaça funciona como caixa acústica, pode ser de tamanhos variados para criar uma variedade de timbres e alturas. Na obtenção das três alturas básicas em música, você tem o “grave” conhecido por “Gunga”, o médio por Viola e o agudo por Violinha.
O arame é percutido com uma varinha, que o tocador segura com uma mão juntamente com o caxixi, enquanto a outra mão aproxima e afasta da corda uma moeda grande (muito utilizado foi o dobrão, antiga moeda portuguesa ) ou uma pedra estreita (conhecida por pedra de Xêxa) a fim de obter sons diferentes. Simultaneamente, aproxima-se ou afasta-se do corpo a abertura da cabaça, para modificar a intensidade do som.

“Berimbau, berimbau
Pedaço de arame, pedaço de pau
Botou a cabaça virou berimbau “...
Canto de roda de capoeira

Entre os toques mais conhecidos estão o São Bento Grande e o São Bento Pequeno. Sempre em compasso binário e com variação dos andamentos, lento, moderado e rápido.
Na roda de capoeira é presença obrigatória e marcante. Ao lado de atabaques, pandeiro e agogô, o tocador do berimbau vai puxando os toques.

Pernas pro alto, meia lua, coqueirinho
Amarra o cordão seu Menino!
Capoeira de Angola ou Regional?
Não importa!
Aqui estou eu; Berimbau


“Berimbau, berimbau, beriba,beriba, berimbau...
Berimbau, berimbau, beriba,beriba, berimbau...”

Canto de roda de capoeira

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

COM QUANTOS PAUS FAZ UMA RABECA

COM QUANTOS PAUS FAZ UMA RABECA
Por Zé Alípio Martins




“Olhe... E é bom que você aprenda! Essa semana mesmo teve um povo do estrangeiro lá em casa querendo me comprar uma rabeca... Eu falava e ele não entendia! Ele falava eu não entendia ele! Daqui a pouco ele fez assim(esfregando o polegar com o indicador), então eu respondi: É 600 real.O home abriu um sorriso tirou do bolso seis notas de cem e ainda me deu duas de 20 por fora!”
Nelson da Rabeca – fabricante e músico rabequeiro.

Estou tendo grandes privilégios aqui em Alagoas. Morar vizinho ao mar... E ao mar de Pajuçara, é muito lindo! Jangadas acordam os seus marujos ainda na madruga pelos estalar de suas velas ao vento. Lembro-me do Mucuripe em Fortaleza e suas velas musicadas por Fagner.Só que aqui elas não “vão sair para pescar”.Elas transportam turistas para as piscinas naturais formadas pelos recifes de pedras.
Com quantos paus se faz uma jangada?
Outro dia de domingo acordei bem cedo pra me lembrar das manhãs de Periperi subúrbio de Salvador onde nasci. “Beira do mar, lugar comum, o começo do caminhar pra beira de outro lugar”, versos de música. Foi lá que comecei...
Aos sábados pela manhã bem cedo, recebíamos os coloridos saveiros. Povo Negro em vestes alvas conduziam em braçadas firmes as últimas e possíveis remadas ante a “quilha” prender numa “coroa” ou banco de areia e então impulsionar a poita à maré. “O restante vai nos braços”.Gritavam eles.
Com quantos paus se faz um saveiro?
Morei até os dezoito em Periperi e nunca fiquei sabendo dos saveiros.
Estive por dois anos pras bandas do Ceará e não soube das jangadas.
Nem me liguei nessas coisas. Só os admirava.Só as admirava.
Toquei por muito tempo com Vanderlei baixista,filho de pescador. Por várias vezes fomos levar algum recado para o pai dele lá em Praia Grande. E lá estava, sempre arrumando a sua velha canoa de pesca.
Construindo, reformando, fazendo, tocando a vida, pescando pra viver...
E eu nunca o perguntei!
Com quantos paus se faz?
Mas hoje, não perco tempo.
Há dois anos participei de um encontro de ethnomusicologia (antropologia da música) aqui em Maceió e conheci Seu Nelson da Rabeca. Comprei seu disco e ficamos amigos.
Mas, agora morando aqui procurei saber: Com quantos paus se faz uma Rabeca?
E foi então que ele me disse:
“Olhe... E é bom que você aprenda! Essa semana mesmo teve um povo do estrangeiro lá em casa querendo me comprar uma rabeca... Eu falava e ele não entendia! Ele falava eu não entendia ele! Daqui a pouco ele fez assim(esfregando o polegar com o indicador), então eu respondi: É 600 real.O home abriu um sorriso tirou do bolso seis notas de cem e ainda me deu duas de 20 por fora!”

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Cancioneiro 02

Casório de Antonio e Mariinha

Corre um boato aqui na cidade
Mariinha vai casar
Antonio comprou umas tarefas
E um bom gado pra engordar

O pai dele tá entusiasmado
A mãe dela foi apressar
Um bom metro de pano de sêda
E as “coisas do enxová”

Galinha assada vai ter bom carneiro
Leitão bem gordo, assado também
Pinga das boas, forró, sanfoneiro
E uma festança até amanhecer

Solteiras fofocam na praça
Da igreja da Matriz
“Deu sorte aquela Mariinha”
“Vai casar e ser feliz”

Galinha assada vai ter bom carneiro
Leitão bem gordo, assado também
Pinga das boas, forró, sanfoneiro
E uma festança até amanhecer

Carroça enfeitada de flores
Leva a noiva pro altar
E os “bebo” querendo
“Ver a festa começar”

Galinha assada...

domingo, 3 de outubro de 2010

Cancioneiro 01

VIDA DE REDE

Dentro da rede balança
Mais uma forma de vida
Se poucos meses criança
Rede na velha batida

Que embalou a mãe preta
Ouviu as canções da Vovó
Pela manhã já descansa
E à noitinha serve até de “urinó”

Já toda esfiapada
Solta os cordões laterais
Desbota na ensaboada
Espicha esguicha lá no varal

Menina que brinca de roda
Vem pra rede mamãe quer ninar
E é nesse embalo de rede Bis
Que vive o povo lá no Ceará

Se tu tá cansado...
E quer descansar
Se tu tá com sono...
E quer cochilar
Se... É pra namoro...
Vem menina

Aqui deita na rede...
Até governador!
O desempregado!
O velho pescador!
Zeca da Cuíca!
E Maria da Fulô!

Das idas ao Ceará (1992)

Pra cantar com a criançada 02

Menina me diz...

Dedicado a Carol(filha), na fase das perguntas.
Por Zé Alípio Martins

Menina me diz...
Quantos dedos têm uma cobra?
E quantos dentes têm um jacaré?

Menina me diz...
Quantos papos têm um sapo?
E quantos ventos trazem uma maré?

E quando a lua...
Quando a lua falta o meio
Eu tenho receio de lhe perguntar

Pra onde foi o cavalo de São Jorge?
E o dragão onde é que está?

Menina me diz...
Quantos palitos têm numa caixa
De fósforos pra riscar?

Menina me diz...
Quantas cartas têm um baralho
De jogo para jogar?

Menina me diz...
Quem é o primo do lobisomem?
Do saci e do boitatá?

Quem mora em casa de botão?
E a chuva onde vai parar?
E...

Menina me diz...

*Pra cantar com as crianças entre em contato e te enviarei a melodia
maestroalipio@hotmail.com

Pra cantar com a criançada 01

O AZAR DA FORMIGUINHA

por Zé Alípio Martins

Formiguinha bateu asas
Bateu asas e voou
Mas era dia de chuva
E formiguinha se molhou

Correu para o buraco
E o buraco encharcou
E azarada formiguinha
Quase que se afogou

Nadou para uma árvore
E o galho se quebrou
Na cabeça da formiga
Logo um galo se formou

E cantou a noite toda
Não deixando ela dormir
Ainda bem que já é cedo
E a formiguinha quer partir

Ai, formiguinha!
Ai, formiguinha! Refrão/Bis
Hoje se o azar é seu
Então a sorte é só minha


*Pra cantar com as crianças entre em contato e te enviarei a melodia
maestroalipio@hotmail.com

sábado, 25 de setembro de 2010

Cuscuz com música

CUSCUZ COM MÚSICA
por Zé Alípio Martins

Sentar-se em tamborete de barraca de comida, em dia de feira, é comum para aqueles que admiram iguarias pesadas.
Sentar-se próximo àqueles que, já cedo, deram conta do seu serviço e esperam quebrar o jejum com um cuscuz, é nos ofertar, em prato cheio, de causos, contos, crônicas, poesias, histórias e música. In loco*!Oferecidos a todo lado e de maneira lúdica e simples podemos nos deliciar como quem também, a muito, jejua.
O descarregar das sacas de milho, arroz e feijão prenunciaram-se os aquecimentos de corpos mal dormidos.
Das caixas de verduras às mantas de carnes, expulsaram os últimos Morfeus* insanos.
Dos olhares opacos, a exatidão das solicitudes: Ares de atenção!
Das bocas entreabertas e sem conformidades; sorrisos sórdidos e presos às faces ressequidas. Um bocejar solfejado a meia boca, bocachiusa,* emitiu um melismático* fraseado.
- Não são somente homens!
- São homens, mulheres, meninas e meninos. Às vezes uma família inteira cantarola: Um pro outro, um após o outro.
- São uns “Brutus”!
- Brutus. Parecem mesmo. Antigos romanos!
- Pó de farinha no rosto das mulheres substitui, momentaneamente, o pó de arroz. Hoje! Sem festas e/ou vaidades.
Saco furado do Coloral* espalhou-se e como “Rudge” bronzeando as peles! Claras, como Lusitanas recém chegadas do Porto!Pardas, na sutil demonstração da miscigenação das belezas.Em epiderme avermelhada, pois Ameríndios que somos ou em negra melanina da africanidade não rara.
“Licença meu filho”. Uma velha anciã pede passagem... Tordilho na cabeça apóia o pote d’água que respinga seu corpo cansado e lento como quem marca o caminho da volta.
- Será que volta?
Meninos adoram! Fazem questão de irem pisando melecando o chão e seguem à busca dos pais. Logo darão o troco à sorte ou a fome.
Um cala-boca daqueles é recheio pro cuscuz fresquinho que Dona Maria da barraca acabara de desenformar.
Um chega... Outro... Se “aproxêga”. Aos poucos, como numa “Confraria”, se encontram e logo são singulares por semblantes e sons.
Vozes graves (homens) em uníssono delineiam uma frase medieval. Logo mais brilhante com a intervenção das agudas (mulheres e crianças). É um murmurinho dos pecados que cresce quase estático, com poucos saltos. Meloso e austero como um Cantochão*.
Por breve momento viajei a um “Mosteiro Beneditino” e logo a uma “Catedral Renascentista”. Posso sentir a polifonia das vozes cantantes. Ricas em linhas horizontais. Valorizadas e atendidas por seus pedidos. Porém, de difícil entendimento quando expressas ao mesmo tempo! No mesmo compasso e andamento.Um contraponto florido dos diabos.
Chega a atendente e rapidamente promove um levare* com uma das mãos que segura uma colher, como que uma batuta*, anunciando o íctus*.
E então! Todos entram e sentam. Já conhecem a sua condução. São semanalmente ensaiados. Ou diariamente ensaiados. De feira em feira...
Atordoada a tantos pedidos, expressa um corte súbito. Gesto entendido. Todos se calam ou diminuem a danação em escala cromática descendente*.
Preferiria um mf*, para não chocar essa gente. E,os poucos, uma dinâmica mais branda. Quem sabe em p* e talvez pp*, para destacar os solos, os pedidos a serem anotados.
- Mas, ela sabe!
- Explica-me meu vizinho de tamborete.
A sujeira deixada em cada veste denota qual é o papel daqueles atores.
Camisas impressas divulgam os seus domínios e lazeres.
Nos ensinam a conjugar o “presente do pretérito perfeito”.

• FELIZ 2006
• VOTE EM ZEZINHO DE DEDÉ 2008
• 1ª CAVALGADA DE JEGUE do Canto Escuro

Quem será o protagonista nessa “Opereta Dantesca*”.
Teremos como tema: “Os Desbravadores da relva matutina”?
Serão eles figurantes? Coadjuvantes? Diretores? Mestres? Tocadores? Brincantes desse “Folguedo” semanal?
Mãos sujas de terra e lama são luvas da Aristocracia portuguesa. Cheiro de peixe seco impregna os corpos suados e sufoca o perfumado Cashmere Bouquet *.
- Chega menina! - Ordena a patroa.
- Aqui não tem esse negócio de garçonete não! Não tem bandeja inox nem aqueles montes de frescuras, mas tem comida boa, gostosa e farta!
- Cheira tanto que dar uma roedeira danada no estomago e arranca lá de dentro uma vontade enorme de sair comendo de um tudo.

1º Ato – Os encontros.
Daqueles que trabalham fixos em suas barracas com os outros que passam.
Dos barraqueiros itinerantes com os fixos.
Dos mercadores e seus “pregões engraçados” com os itinerantes.
Dos que descarregam as “coisas” transportando na cabeça com os que observam.
Vão...De um lado e de outro. Pra um lado e pra outro.
Ou d’aqueles que, semanalmente, vão à feira só “lavar a jega”sem medo do Colesterol LDL.

2º Ato – O Remorso (ão)
- Quando cai doente quer culpar a mulher da comida!
- Ou a rabada da vaca!
- Nunca mais como “essas coisas”.

3º Ato – Estratégias.
Tem aqueles que não assumem que comem “essas coisas” e passam lá por trás carregando, em suas belas sacolas, escondidinho um “fato de boi fresquinho”, mocotó de boi, “alvinho”.
De longe, por cima de tudo, só se ver pé de alface e molho de coentro bem verdinho.
- Pra que isso! Se seu olhar diz tudo. Doido pra “cair matando” nesse cuscuz com ensopado.

4º Ato - Contextualizando
Sim, e em falar em cuscuz...
Esse amarelinho é comido de Norte a Sul do nosso Continental Brasil. Está presente em todas as mesas e em todas as regiões do país. Tem versões e adaptações diversas. Combinações de todo tipo: Com carne de boi cozida e assada. Galinha ao molho branco ou pardo. Rabada, mocotó, fatada, com peixe, moqueca, escaldado, cortadinho de verdura...
- Ô menina! Me vê o meu com mocotó.
- Tá afoito véio?
- O meu com ensopado de carneiro.
- Tá certo também.
- Traz um pouco de pimenta.
- Tá na mesa.
- Pra mim com porco assado.
- Vou ver.
- Tem?
- Tem.
- Tu sabes fazer cuscuz? Então, anota a receita.

4º Ato – Os finalmentes

RECEITA DE CUSCUZ

Fubá “sarolhado” e sal a gosto
Num tacho de barro põe pra descansá
Se quiser pode enfeitar o danado
Com queijo, salame ou carne de jabá
Mas querendo come-lo de forma tradicioná
Basta que o bote no fogo
E espere o danado cheirá.

Outros te batizam com nome sulista
Sofisticando em legumes o seu paladá
Mas é o mesmo cuscuz que alimentou Dona Julia
Seu filho Alfredo e a neta Guiomá
- Obrigado!
- Rapaz, já comi um feito de fubá de roça em cuscuzeiro de barro... Que é um negócio sério.
- É gostoso também feito na boca da panela. Minha mãe improvisava quando a gente viajava e não levava o cuscuzeiro...
Era só colocar a massa num prato, envolver com um pano de saco “limpo”, virar o prato de cabeça pra baixo na boca de uma panela com uns três dedos de água e amarrar. Daqui a pouco olha o danado cheirando.
- O gosto pelo cuscuz deve ser pelo fato de sua composição conter ingredientes das três culturas estruturantes do nosso povo.
- Deve ser por isso que tanto agrada!
- A base da cozinha brasileira sem dúvida é: a cozinha portuguesa a indígena e a africana.
É só observar os ingredientes no feitio dos diferentes pratos. Da mesma forma, e proporção que na “Cozinha”, acontece com a nossa música. Os nossos gêneros musicais estão recheados desses três elementos.
Uma pitada a mais ou a menos de ingredientes provindos desses povos díspares, “não chega a estragar a receita”. “Fica é no ponto”.
A diáspora nos contaminou em rítmicas exclusivas.
Dos presentes a “milênios”, sutis artefatos timbrísticos.
Da ansiedade do colonizador em “retórica improvisada” à imposição dos fazeres ocidentais, uma re- leitura, aos nossos moldes.
E assim ficamos... Fartos!
Cuscuz com música em “teatro de arena” com cobertura de lona plástica.
Opereta em sons guturais.

Referências existências aos sem vergonhas do nosso povo CUSCUZ.
• WWW.BarracadeD.Maria@Cuscuz.com.br

*In loco = do latim no local (ali mesmo na barraca da feira)
*Morfeus= Deus grego do sono (desculpa de quem ficou tomando umas até as tantas)
*bocachiusa = cantar com a boca entreaberta (pra não espanar a farinha)
*melismaático = uma sílaba para uma enorme linha melódica (entendeu?)
* Brutus = do romano (Brabo)
* Coloral = Corante bastante usado em culinária nordestina. (ai você conhece)
*Rouge= pó usado em maquiagem. (pra as caras pálidas)
*uníssono = mesmo som.(quando afinados)
*cantochão= melodias cantadas sem saltos como o Canto Gregoriano. (vá pesquisar)
*polifonia = do grego várias vozes, forma de composição renascentista. (é bom ouvir)
* contraponto florido = contraponto musical em diferentes durações .( não é fácil deexplicar)
*aproxêga = termo caipira, mesmo que aproxima. (é pouco mais que isso)
*levare = do italiano levantar, termo usado em regência ( não é de classe)
*batuta = instrumento do maestro. (para condução de entradas e sinais musicais)
*íctus = mesmo que primeiro. (tempos musicais)
*escala cromática descendente = escala musical que utiliza semitons do grave para o agudo
* mf,p,pp = sinais de intensidade: mf= meio forte, p= piano(fraco) pp= pianíssimo(+fraco que piano)
* Opereta Dantesca = Pequena ópera com referência ao escritor Dante Alighiere da Divina Comédia
*Folguedo = festas da cultura popular.(reisado,sambas,pastoril,chegança,guerreiro...)
*Cashemere Bouquet = marca de desodorante popular.( certamente vai dizer que já usou)
*Guturais = sons produzidos na garganta (ríspidos e rouco)

Só em Guga!

Só em Guga...
Para o escritor Guga do boteco “Esquina do povo”- Alagoinhas-Ba.
Por Zé Alípio Martins

Cerveja e Acarajé só em Guga. Mistura perfeita.
Mas, também tem o velho bate-papo, a velha resenha.
Entre acarajés e resenha e toma-se outra.
Na passagem pra servir outro cliente, e o velho Guga opina sobre assunto que pegou pela metade.
- Ê, Rapaz ! Não é sobre isso não!#¨$ @?*!)?!? Retruca Afonsinho, irado.
E assim entra a noite... Passa a esposa “boa” de fulano de tal...Aquele menino(a) com jeito de boiola... Àquele velho ensaiando poesias... A gatinha que gosta de acarajé, mas come abará para não perder a forma. Encosta um bêbo no balcão e bate uma...Alguém pergunta se tem onde lavar as mãos e passa horas no mictório...Tem uma mesa com quatro cadeiras e um solitário...
- Posso ?
-Não, tô esperando alguém.
- E esse alguém não chega.
Três pessoas atendem aos celulares e parecem conversar com quem passa do outro lado da rua.(Que mania?)
Daqui a pouco uma “topique” pro Riacho D'Guia ,levando professores que sonham no retorno tomar uma...
É conversa e assunto que nunca se esgotam e a gente, marca sem querer, de jeito nenhum, pra o outro dia. E começa tudo de novo...
Cerveja, acarajé, Guga, os amigos, resenha,papo,mulher,celular,”topique”...

E... até lá!!!
-Onde?
Em Guga (Esquina do povo), é claro!!!!!